Autoras que começaram na internet lançam seus livros na Bienal

Conheça a trajetória de Juliana Dantas, Clara Alves, Lucy Vargas e Babi Dewet 

 

O termo Fanfic, ou fanfiction, vem do inglês e significa ficção do fã, na tradução literal. São histórias criadas por fãs, que podem ser baseados em bandas, livros, filmes e séries. Normalmente são publicadas em fóruns ou sites especializados, como o fanfic obsession, fanfic.net, e o mais famoso atualmente, wattpad. Meg Cabot, atualmente, a grande inspiração para muitas jovens escritoras, começou escrevendo  sobre esses universos. No início, era Star Wars, com a filha da princesa Leia na escola Jedi como protagonista. Com o tempo,  sentiu a necessidade de criar o seu próprio universo, lançando, assim, os livros de O Diário da Princesa. 

 

Assim como o universo fanfic, a internet também é porta de entrada para novos autores. Na Bienal 2019, conhecemos a história de quatro delas, que falaram das dificuldades e, também, do que é ser um jovem autor no país.

 

Algo em comum com Meg Cabot

Juliana Dantas começou a escrever em 2006, depois de ler fanfics sobre a série Lost nos fóruns do Orkut. Ela não parou mais e, ainda nessas comunidades, chegou a escrever sobre outros temas, como Harry Potter e McFly. “No começo, criei um blog e três pessoas tinham lido. Me senti muito feliz!”. Cada vez mais pessoas buscavam o seu portal e, quando Juliana começou a escrever sobre Crepúsculo, 300 chegaram a acompanhar as histórias. Muitas das suas leitoras atuais a conheceram na época das fanfics. Na edição 2019 da Bienal, lançou seu livro inédito, No Silêncio do Mar, pela editora Harper Collins. É a segunda vez que ela participa do evento. 

 

“É incrível, nunca imaginei, estou realizando um sonho!”, declarou. Ela, que cresceu lendo os livros de Meg Cabot sem saber que a escritora americana começou no universo das fanfics, disse: “Já posso dizer que tenho algo em comum com ela”.

 Mas a transição para o livro foi difícil. No fanfic, o autor utiliza um universo que já existe, além de ter os fãs fiéis que procuravam as fanfics para preencher algo na original. “Eu estava acostumada a usar personagens alheios para escrever minha própria história. Então, quando você passa para tudo original, começa do zero, basicamente. Eu tinha um certo receio, mas no final deu tudo certo!” comemorou. 

 

Antes de lançar suas obras pela Harper Collins, Juliana fez sucesso publicando no site da Amazon e, para ela, se lançar nesses novos portais é uma ótima oportunidade para quem quer estrear no editorial. “Antigamente, para publicar você precisava viver nas chancelas de um editor. Hoje, não. Hoje qualquer um pode publicar seu próprio livro e viver da base de fã da internet”. 

 

Trabalhar no que gosta

Clara Alves também começou na Amazon. Formada em jornalismo pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ), a autora, de 26 anos, começou escrevendo webnovelas nos fóruns do Orkut, em 2008. “Foi o primeiro molde que eu vi, de publicar capítulo por capítulo e as pessoas irem comentando, ao vivo”. Mas ela já gostava de escrever antes mesmo de conhecer as comunidades da rede social. 

 

Clara sempre foi muito incentivada a ler, e, quando tinha oito anos, leu Harry Potter e ficou encantada com o universo criado por J.K. Rowling. “Eu achei tão incrível que decidi sentar e escrever meu livro”. Eram pequenos contos que falavam da autora e dos seus amigos da escola. “As Aventuras de Maria e sua Turma, quase uma auto-ficção”. Além de J.K., Meg Cabot e Thalita Rebouças eram grandes inspirações. 

 

A oportunidade para publicar surgiu depois de voltar de um intercâmbio na Irlanda, em 2015, quando decidiu se divulgar de forma independente. “Voltei de viagem com a certeza de que não queria nunca mais trabalhar com algo que eu não gostasse”. Em 2017, teve a oportunidade de conhecer a Increasy, sua consultoria literária, e apresentar um projeto que estava no wattppad. Elas adoraram e Clara começou um projeto com o intuito de apresentar para editoras. “Eu não tinha nem 15 páginas e apresentaram para a Seguinte, que gostou, pediu pra ler o que eu tinha e perguntou ‘quando ela termina?’”. 

 

Clara finalizou o livro Conectadas em dois meses e lançou na Bienal deste ano. Em 2017, a autora participou na edição do Rio e na de São Paulo como independente e conta que foi muito cansativo: “É um gasto muito grande, porque eu paguei para ter um lugar num estande pequeno e o retorno não é muito. Você precisar abordar todo mundo para fazer as pessoas conhecerem, porque era uma editora pequena, então foi trabalhoso, mas foi uma experiência”. Em 2019, foi a primeira vez que ela esteve com um grande expositor, além disso, foi sua estreia na programação oficial da exposição, no painel sobre autoras que começaram na internet. “Só de ter alguém te dando um suporte é uma diferença muito grande. Acho que estou muito deslumbrada!”. 

 

Para quem faz comunicação e quer seguir carreira no editorial, Clara diz que o curso ajuda os estudantes a lidarem com as pessoas e na própria divulgação da sua imagem. “Você acaba ganhando um leque de experiências e habilidades que são muito maiores. Ajuda, porque ser escritor não é fácil”. Atualmente, é mais fácil para um autor independente conseguir publicar. Plataformas como Amazon Kindle Unlimited e Google Livros ajudam na hora do lançamento on-line, sem necessidade de uma editora. Para Clara, o Amazon Unlimited é a melhor forma dos autores independentes se publicarem. “Você não paga muito para lançar, então essa é a vantagem, porque muitos não têm dinheiro para investir no independente e o livro físico sai muito caro, então eu sempre indico para quem quer começar”.

Literatura inspirada na música

Lucy Vargas também fez comunicação na UERJ e tinha 15 anos quando descobriu o universo das fanfics. O protagonista das suas histórias era Taylor, vocalista do grupo Hanson, sobre quem manteve um site com histórias até os 18 anos. “Era divertido e fiz amigos através disso. Até ganhei uns prêmios nos concursos que havia na época”, lembrou. Leitora ávida desde os 13 anos, as histórias serviam de inspiração na hora de escrever, além de séries e filmes. Como estava sempre tendo ideias, a autora passou a escrever suas fanfics em formato de livro, postando capítulo por capítulo no seu blog, então, a transição para o editorial não foi difícil. 

 

 Assim como Clara, Lucy também começou publicando independentemente no Amazon, iTunes e Kobo. “Para minha surpresa, comecei a vender bem”. Dois anos depois, surgiu a oportunidade de lançar seus livros na versão física. A Editora Charme estava lançando um catálogo de romances de época e procurava por uma autora nacional. “Elas gostaram do meu romance e O Refúgio do Marquês foi publicado”. Além disso, em 2014, a carioca foi a primeira autora independente brasileira a ser convidada para fazer parte do Google Play Livros, o que a ajudou a construir uma base como escritora e a levou para um público novo, numa época em que o Kindle ainda não era tão popular no país. “Algumas das minhas leitoras mais engajadas vieram de lá. Como autora, uma das coisas que sempre quis foi chegar a diferentes públicos e consegui isso através do Google”. 

 

Para ela, os novos meios de ler revolucionaram a literatura, pois libertaram os autores ofertando grandes plataformas para suas publicações. “Atualmente, você pode ser o dono da sua carreira e levá-la como quiser. Você pode ser um best-seller por sua conta, como já aconteceu com vários autores conhecidos. Ou pode simplesmente publicar suas histórias no seu tempo livre, sem precisar se dedicar à carreira e, mesmo assim, ter um público te lendo.”

 

Na Bienal deste ano, Lucy lançou pela Editora Record o seu mais novo romance, Um Acordo de Cavalheiros. Para ela, participar do evento é incrível e a ajuda a ter fé na literatura e no interesse do público pelo livro. “É maravilhoso, porque a energia que os leitores te passam é revigorante. Encontrar os leitores e interagir, ver outros autores e se sentir parte de tudo aquilo é um dos melhores momentos da vida de autora. É como se fosse o momento que esperamos a cada ano”. 

 

O digital como inspiração para o livro físico

Veterana na Bienal, Babi Dewet também decidiu publicar sua fanfic de forma independente, com o objetivo de entender o mercado primeiro. “As editoras não estavam interessadas em livros jovem adulto no Brasil”. A vontade de lançar o projeto surgiu quando o site para qual escrevia, o fanfic addiction, passou por uma reforma e ela precisou retirar a história do servidor. “Na época eu pensei: nossa seria legal poder lançar isso”. Então, juntou com uma amiga que gostava de literatura, e hoje é sua agente literária, pesquisou como chegar ao mercado. “Nós fizemos todo o passo a passo, ligamos para gráfica para saber quanto ia custar a impressão com papel branco ou o amarelo, capa fosca, preto e branco ou colorida…”

 

Na hora de reescrever a fanfic para transformá-la em livro, a Babi sentiu muita diferença. Principalmente porque ela não podia usar os nomes e as músicas do McFly. Precisou, então, criar um universo e descrever os personagens, algo que na internet não precisava, porque o leitor já sabia. “Eu tive que recriar todos os personagens do zero e colocar tudo isso numa história que estava muito pronta na minha cabeça. Mas se você ler Sábado à Noite hoje em dia, ele ainda vai estar muito próximo da fanfic”. 

 

Se Babi tivesse plataformas como a da Amazon e do Google, na época que lançou pela primeira vez, seria mais fácil. “Hoje em dia isso é uma vitrine muito grande”. Para ela, esses novos meios mudarão o mercado editorial e os escritores poderão ter direito total sobre a história. A dica para quem escreve on-line e quer se lançar é: continue na internet. “Escreva com personagens originais e vá para Amazon, mantenha seu público de fanfic indo com você”. Cativar os leitores on-line foi, para ela, uma ponte para o sucesso: “conseguiu vender mil exemplares em um ano”, lembrou. 

 

Por Luiza Almeida, 5º período

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